Esporotricose em Gestantes: Um Alerta sobre a Saúde Materna no Brasil

Esporotricose na Gravidez: Desafios e Soluções

A esporotricose, uma micose subaguda ou crônica causada por fungos do gênero Sporothrix, apresenta-se como um problema emergente de saúde pública em regiões tropicais e subtropicais. No Brasil, sua transmissão zoonótica associada a gatos infectados tem gerado surtos preocupantes, especialmente no estado do Rio de Janeiro. A situação se torna ainda mais delicada quando afeta gestantes, uma população vulnerável devido às limitações terapêuticas impostas pela gravidez.

Dados do Estudo

Um estudo retrospectivo realizado no Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas, da Fiocruz, analisou 58 casos de esporotricose em gestantes atendidas entre 1998 e 2023. A mediana de idade das pacientes foi de 27 anos, com predominância de mulheres negras (64,4%). A maioria contraiu a infecção durante a gravidez, com idade gestacional mediana de 17 semanas.

Entre as formas clínicas, a linfocutânea foi a mais prevalente (63,8%), seguida pela fixa (19%) e disseminada cutânea (12%). Casos extracutâneos foram raros (5,2%), mas incluíram apresentações graves como osteomielite e esporotricose ocular.

Tratamento e Resultados

O manejo das gestantes envolveu principalmente terapias físicas, como termoterapia e criocirurgia. Para casos graves, como formas disseminadas, foi utilizada anfotericina B, considerada segura durante a gestação. Entre as pacientes acompanhadas até a cura (n=44), todas apresentaram regressão completa das lesões.

No entanto, 24% das pacientes foram perdidas no acompanhamento, evidenciando desafios na adesão ao tratamento. Aquelas que completaram o seguimento necessitaram de uma mediana de 122,5 dias para a cura, ligeiramente superior ao tempo observado em populações não grávidas.

Impactos da Esporotricose na Gravidez e no Recém-Nascido

Apesar dos desafios no manejo terapêutico, a infecção não demonstrou risco de disseminação para o feto nem agravamento significativo devido à gestação. Os desfechos gestacionais e neonatais foram favoráveis na maioria dos casos, com 80% dos bebês nascendo saudáveis.

No entanto, em casos de exposição inadvertida a medicamentos contraindicados, como itraconazol, não foram observadas associações estatisticamente significativas com desfechos desfavoráveis. Essa observação destaca a importância de protocolos rigorosos e da conscientização sobre medidas preventivas, como o uso de contraceptivos durante o tratamento.

Perspectivas e Necessidade de Educação em Saúde

A esporotricose em gestantes ressalta a necessidade de uma abordagem multidisciplinar e de políticas públicas que promovam a prevenção e o acesso ao diagnóstico e tratamento. A educação em saúde, especialmente em áreas hiperendêmicas, é fundamental para reduzir o impacto da zoonose e proteger populações vulneráveis.

Com o aumento de casos em mulheres grávidas, é essencial reforçar medidas preventivas durante o pré-natal, como evitar contato com gatos infectados e priorizar a identificação precoce de lesões suspeitas. Além disso, estratégias para garantir adesão ao tratamento, incluindo suporte psicológico e flexibilidade no agendamento de consultas, podem melhorar os resultados terapêuticos.

Referência: FREITAS, D. F. S.; CUNHA, R. P.; DE OLIVEIRA, R. V. C.; DE MACEDO, P. M.; DO VALLE, A. C. F.; REZENDE, A. P. M. B.; EIRAS, R. V.; CURI, A. L. L.; CARVALHO, E. M.; DE MORAES, R. L.; ALMEIDA-PAES, R.; ZANCOPÉ-OLIVEIRA, R. M.; GUTIERREZ-GALHARDO, M. C. Sporotrichosis during pregnancy: A retrospective study of 58 cases in a reference center from 1998 to 2023. PLoS Neglected Tropical Diseases, v. 18, n. 12, p. e0012670, 2024. DOI: 10.1371/journal.pntd.0012670. Disponível em: https://doi.org/10.1371/journal.pntd.0012670.

Lucas W.S de Sousa, Biomédico Microbiologista editor e idealizador da página Microbiologia Clínica Brasil.