O Avanço Alarmante das Superbactérias no Brasil
Nos últimos anos, observa-se no Brasil a disseminação acelerada de bactérias multirresistentes, as chamadas superbactérias, que desenvolveram resistência a várias classes de antibióticos.
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Lucas W.S.Sousa
1/14/20244 min read
O Avanço Alarmante das Superbactérias no Brasil
O surgimento e disseminação acelerada de bactérias multirresistentes, as chamadas superbactérias, tem sido motivo de grande preocupação entre especialistas no Brasil e no mundo. Trata-se de microrganismos que desenvolveram resistência a diversas classes de antibióticos, ficando praticamente imunes à ação desses medicamentos.
De acordo com pesquisas recentes, o Brasil registrou 33,2 mil mortes em 2019 diretamente relacionadas a infecções por essas bactérias. Outras 138 mil tiveram participação das superbactérias junto com outras doenças. Os grupos mais afetados são os extremos da pirâmide etária: recém-nascidos e idosos.
Entre os fatores que têm favorecido o aumento dessas bactérias multirresistentes, o principal é o uso excessivo e indiscriminado de antibióticos tanto na medicina humana quanto veterinária. Na pandemia de Covid-19, observou-se um aumento no consumo desses medicamentos em hospitais e também na comunidade, o que provavelmente acelerou a disseminação das superbactérias.


Além disso, o descarte inadequado de antibióticos no ambiente contribui para selecionar micro-organismos resistentes. Pesquisas vêm detectando a presença dessas bactérias multirresistentes não só em ambiente hospitalar, mas também na comunidade, em amostras de água, solo, alimentos e animais. Isso amplia o risco de transmissão para a população em geral.
Sem antibióticos eficazes, procedimentos médicos fundamentais como cirurgias, transplantes e sessões de quimioterapia podem ficar comprometidos, já que o risco de infecção aumenta consideravelmente. Até mesmo infecções comuns, antes facilmente tratáveis, podem voltar a se tornar graves e fatais com o avanço das superbactérias.
Diante desse cenário alarmante, especialistas recomendam medidas para controlar o uso de antibióticos e conter a disseminação das bactérias multirresistentes. Entre as principais ações indicadas estão: melhorar a higiene pessoal e dos alimentos, evitar ao máximo ambientes hospitalares, utilizar antibióticos apenas quando estritamente necessário e seguindo corretamente a dose e tempo de tratamento indicados.
Também é fundamental aprimorar a vigilância para detectar novos casos de resistência bacteriana e isolar pacientes infectados, além de tratar adequadamente o esgoto hospitalar. Outra frente importante é investir mais em pesquisas para o desenvolvimento de novos medicamentos eficazes contra as superbactérias.


Estudo revela disseminação alarmante
Um amplo estudo publicado em 2023 na revista Clinical Infectious Diseases analisou mais de 80 mil amostras de bactérias coletadas em hospitais de todas as regiões do Brasil entre 2017 e 2022. Detectou-se um aumento significativo na frequência de genes que conferem resistência a importantes classes de antibióticos, como os carbapenêmicos.
Entre as principais bactérias que adquiriram esses genes estão Klebsiella pneumoniae, Escherichia coli e Acinetobacter baumannii. Essas evidências reforçam que o problema da resistência antimicrobiana se disseminou rapidamente no país durante os anos da pandemia de Covid-19.
Presença fora do ambiente hospitalar
Outro aspecto preocupante é que essas bactérias multirresistentes já foram detectadas em diversos ambientes fora do contexto hospitalar. Pesquisadores as encontraram na água de rios e córregos em análises feitas em mais de 50 cidades do estado de São Paulo.
Também foram identificadas infectando animais marinhos como baleias, golfinhos e aves costeiras. Além disso, estão presentes em amostras de carne, vegetais e em animais de estimação atendidos em clínicas veterinárias. Isso amplia os riscos de contaminação da população.
Contaminação por descarte incorreto
A contaminação ambiental ocorre, entre outros motivos, pelo descarte incorreto de resíduos hospitalares e de sobras de antibióticos eliminados pela urina e fezes de pacientes tratados com esses medicamentos. Muitas vezes, o esgoto hospitalar não recebe tratamento adequado para remover os antibióticos antes de ser lançado na rede pública.
Diante disso, algumas iniciativas buscam mapear a presença de bactérias multirresistentes nas cidades, como um projeto que analisa amostras de água potável, de rios, esgoto comum e hospitalar em São Caetano do Sul, na Grande São Paulo. O objetivo é avaliar se o uso adequado dos antibióticos pode ajudar a reduzir a disseminação dos microrganismos resistentes.


Projeções futuras preocupantes
Caso nada seja feito para conter as superbactérias, as projeções são sombrias. Um estudo encomendado pelo governo do Reino Unido estima 10 milhões de mortes anuais no mundo por infecções resistentes a antibióticos em 2050. As perdas econômicas globais podem chegar a assustadores US$ 100 trilhões.
Portanto, é fundamental que autoridades de saúde, governos, profissionais da área médica e a população em geral se mobilizem e tomem medidas urgentes para controlar esse grave problema de saúde pública antes que seja tarde demais. Investir em prevenção e no desenvolvimento de novos antibióticos é essencial para evitar que doenças antes tratáveis se tornem incuráveis nas próximas décadas.


Lucas W.S.Sousa, Biomédico Microbiologista, editor e idealizador do Microbiologia Clínica Brasil